CONCLUSÃO DO SEGUNDO CONTO DE “UM CASO POLICIAL NO NATAL”
Voltamos
hoje ao segundo conto do concurso “Um Caso Policial no Natal”, com a publicação
da sua segunda parte e conclusão. Recordamos que na passada edição o seu
principal personagem, João Marcelino, tinha sido confrontado com um incidente
ocorrido com o seu amigo Xico Bala, funcionário de um importante hotel do
Porto, que havia passado algumas horas com uma mulher casada num dos
apartamentos daquela unidade hoteleira e esta agora acusa-o de ele ter roubado
a sua carteira, ameaçando-o de apresentar queixa à gerência, o que pode
determinar a perda do emprego. João Marcelino ficou muito preocupado com a
situação do amigo, mas…
“(…)
Olhei para o relógio, bolas 23:50, a minha bonequinha já deve ter saído.
Liguei. No meu melhor inglês aprendido com os turistas na Ribeira a quem
pedíamos moedas para saltar da ponte D. Luís, fiquei ainda mais transtornado.
Natasha chorava copiosamente. O chimpanzé Francis que cresceu com ela nos
circos por esse mundo fora, desaparecera misteriosamente do Coliseu no final da
sua atuação ainda na 1ª parte do espetáculo. Só deram por falta dele no final e
quando estavam a proceder às arrumações e alimentação dos animais. Estava
desolada e inconsolável. Entre soluços pedia desculpa por não poder estar
comigo, mas iriam passar a noite em buscas na cidade. Francis, extremamente
afável e simpático poderia ficar agressivo fora do seu ambiente. Caramba,
primeiro o Xico, agora Natasha, que noite!”
“Um Caso Policial no Natal” – SEGUNDO CONTO
O FANTASMA DO HOTEL INFANTE SAGRES, de Bernie Leceiro
II – PARTE (conclusão)
Voltei para junto de Xico Bala, mas o meu pensamento estava na mansarda
do Hotel Infante Sagres, em Francis e no conforto dos lençóis de cama do Hotel
Aliados que eu estava a perder, veio-me à lembrança o clássico de Os Crimes da
Rua Morgue de Edgar Allan Poe por muitos considerado como a primeira obra
policial de sempre e cuja leitura eu sempre recomendava na FNAC a quem se
queria iniciar na leitura deste género literário. Seria possível os dois
acontecimentos dessa noite estarem relacionados?
Liguei novamente à Natasha, uma vez mais com o meu melhor English accent:
– My love, qual é o alimento preferido de Francis?
– Paw Paw, respondeu.
– What?!?
– Asimina Triloba, é uma fruta exótica, mas normalmente só come quando
estamos em digressão no continente americano.
Desliguei, combinando encontro para mais logo na ajuda da busca por
Francis e marco o número de Nanda, uma moça roliça com banca de fruta
“estranha” no 1ºandar do Bolhão, de quem ganhei confiança e intimidade à custa
da minha fama no mercado de “abichanado”. Num final de tarde partilhamos o
exíguo espaço para troca de roupa existente no mercado, quando ela estava
atrasada para ir ao dentista e eu para a FNAC… o resto não vale a pena contar…
Nanda faltou à consulta e eu quase fui despedido por faltar mais uma vez sem
avisar.
– Olá Nanda, é Carlinhos – no mercado sou assim conhecido, uma espécie de
nome artístico para a personagem que encarno – sabes o que é a fruta Pau-Pau?
– Olá torrãozinho, em que está agora tu a pensar meu maluco?
– A minha irmã Vanessa acha que está grávida e tem esse desejo, acho que
viu a story de uma influencer no Instagram… preciso dessa fruta agora … ela
está doida … não deixa ninguém descansar – improvisei.
– Já sei o que é! acho que tenho na câmara frigorifica do mercado, é a
“banana do homem pobre” tenho uma cliente “fozeira” que é doida por isso. Diz
que lhe conserva a pele, é chanfrada, está toda encarquilhada com a cara a cair
aos bocados! Encontramo-nos no mercado daqui a meia-hora. Mas, olha lá meu
“conguito”, vai-te sair caro…
Abreviando, à hora marcada encontrei-me com a Nanda junto à porta da rua
Fernandes Tomás, na companhia do Xico a quem apresentei como o namorado da
minha irmã, não fosse ela ter ideias aquela hora da noite que me desviassem do
pretendido, peguei na fruta, despachei Nanda com um beijo bem rápido e
dirigimo-nos apressadamente para o Hotel Infante Sagres, sem antes passar no
Coliseu a apanhar a chorosa Natasha. Se tudo batesse certo, rapidamente iriamos
saciar a fome e descobrir a identidade do famoso fantasma.
Descemos as ruas Passos Manuel e Dr. Magalhães Lemos, atravessamos a
aquela hora deserta Avenida dos Aliados e percorrendo apressados a rua Elísio
de Melo chegamos ao nosso destino. Com o coração aos saltos subimos os 12
lanços da escada de serviço do hotel. Na minha retaguarda seguiam Xico e
Natasha assustadíssimos e eu sem saber muito bem o que nos aguardaria e como
reagiríamos. Aliciado pelo intenso aroma da fruta Paw Paw, que eu, entretanto
descascara e partira num tupperware que Xico fora apanhar na cozinha, do fundo
do escuro corredor surge o fantasma, nada mais nada menos que Francis. Com um
velho abajur a enfeitar a cabeça, a mala da dama debaixo do braço e a beiça
pintada de um vermelho Chanel, oriundo de algum batom abandonado no interior da
mala, que enfeitava um imenso sorriso como a dar-nos as boas-vindas.
O malandro tinha entrado no pátio interior pelo acesso de serviço do lado
da rua do Almada, subiu por um tubo de queda do alçado tardoz do hotel e entrou
por uma estreita janela sempre aberta de uma velha casa de banho fora de
serviço ao fundo do corredor e onde se tinha refugiado.
Natasha estava radiante, Francis
deliciado com a sua fruta favorita e Xico Bala eternamente agradecido, salvara
o emprego e poderia manter os seus esquemas amorosos.
04:40, a noite estava salva e o Natal de 2014 também. Este que foi o último ano em que o famoso circo de Natal do Coliseu teve a atuação de animais em pista. A tradição mantém-se desde 1941, ano da inauguração do Coliseu, o Circo que é uma das principais e mais concorridas atrações de Natal da cidade do Porto.
AVALIAÇÃO-PONTUAÇÃO
Os nossos leitores têm a partir de agora 30 (trinta) dias para proceder à avaliação deste segundo conto a concurso e ao envio da pontuação atribuída, entre 5 a 10 pontos (em função da qualidade e originalidade), através do email salvadorsantos949@gmail.com. Recorda-se que o conto vencedor do concurso será o que conseguir alcançar a média de pontuação mais elevada após a publicação de todos os trabalhos, sendo possível (e muito desejada!) a participação dos autores no “lote de jurados”, estando, porém, impedidos de pontuar os seus originais (escritos em nome próprio ou sob a forma de pseudónimo), de maneira a não “fazerem juízo em causa própria”.
Iniciou-se hoje o Torneio Memória, com a publicação do seu primeiro problema.
Ei-lo:
Torneio
Memória
Problema nº 1
CRIME NO
PARQUE
Certo dia recebi
ordem para ir a um Parque esclarecer um caso para o qual já se haviam tomado
algumas providências.
Chegado lá,
notei que o recinto era uma autêntica ilha, ligada com a cidade apenas por uma
pequena ponte por onde, forçosamente, todos tinham que passar. O polícia de
serviço àquela área, informou-me:
— Estava sobre a
ponte quando ouvi um tiro. Dei ordem ao guarda do Parque para não deixar entrar
ou sair ninguém, e vim observar o que se passara.
Entretanto,
aproximámo-nos do local do crime e verifiquei, então, que dentro dum barco,
encostado ao cais, jazia um homem atingido com um tiro em pleno peito. A vítima
passeara com uma das três pessoas suspeitas — tantas eram as que se encontravam
dentro do Parque.
Pude tirar, em
seguida, os seguintes apontamentos:
FREITAS —
Combinara com a vítima vir esperá-la, a fim de tratarem de certos negócios (não
quis
dizer de que
espécie eram ...), e passeava pelo Parque quando soou o tiro.
RAUL — Estava à
pesca num sítio ali perto e, como os outros, viera ver o que se passara.
MOTA — Fora
passear, no barco, com o amigo e, quando pretendia atracar, encostando a popa
ao
cais, ouviu o
tiro e voltou-se, vendo ainda um vulto a fugir por entre as árvores do Parque.
Havia, também, o
guarda, que afirmou: «apenas ter ouvido o tiro e seguido, à risca, as
instruções do polícia».
Com estes
elementos arquitetei uma teoria, nada falha de lógica, que, depois, vi ser a
verdade. Por
isso, pergunto:
1.º — Quem
matou?
2.º — Porquê?
A solução deverá
ser enviada até ao final do dia 31 de janeiro de 2024 para
o endereço apaginadosenigmas@gmail.com.
São já conhecidos
a solução do problema “O Mistério da Casa de Penhores” e o nome vencedor do
prémio em disputa, que registou a participação de 26 concorrentes.
Aqui fica a
solução de autor, critério classificativo e pontuação atribuída aos concorrentes,
bem como o nome do vencedor:
Solução do
Problema
Há contradição
entre as declarações e os factos.
Onde está a
contradição?
Luís Gomes
estava fortemente amordaçado, pelo que nunca poderia gritar, chamando pelo
colega.
Só que, não há
apenas uma contradição, mas duas. Se Luís Gomes não podia chamar por
Carlos Ferreira, este não poderia ouvi-lo a fazer esse apelo, como diz que
sucedeu.
Conclusão:
mentem os dois e por isso são cúmplices. O roubo foi efetuado em cumplicidade
por Luís Gomes e Carlos Ferreira.
Este era o
elemento principal que serviria para tornar os dois elementos, Luís e Carlos,
suspeitos.
Há ainda o
escadote, que deveria servir para chegar à parte mais alta dos móveis. Os
assaltantes teriam que o usar para lá chegarem, pois todas as gavetas,
incluindo as que estavam próximas do teto, foram abertas, no entanto, Luís
Gomes nunca referiu que o mesmo saíra da arrecadação.
Uma possível
sequência dos factos foi: 1 - os dois chegaram bastante cedo; 2 - destruíram as
câmaras de filmar e os registos das mesmas; 3 - roubaram tudo o que estava em
gavetas e vitrines, tendo usado o escadote e colocando-o posteriormente na
arrecadação, 4 - um deles, ou os dois, foram colocar o resultado do assalto
noutro local. 5 - regressaram e cortaram um tecido que serviria de mordaça,
assim como as cordas que presumivelmente atariam as mãos de Luís; 6 -
aguardaram que as 9 horas chegassem e Carlos telefonou ao patrão e à polícia.
Nota-se que
houve a tentativa, feita pelos dois cúmplices, de darem alguma coerência à
narrativa que apresentaram, assim como se contentaram com os materiais de menos
valor, mas... não há crime perfeito.
Numa
classificação em que apenas se pretende fazer uma distinção simplificada, sem
seleção dos melhores, o pormenor do escadote e a sequência dos eventos não são
imprescindíveis, mas tornar-se-iam relevantes se, acaso, se pretendessem
selecionar as melhores.
Saliente-se que
apenas um concorrente refere a possibilidade de o escadote poder ser utilizado.
Chama-se a
atenção, que o Torneio Memória, prestes a iniciar-se, já terá essa
seleção das melhores soluções, pelo que há que ter cuidado com todos os
pormenores.
Critério
Classificativo
Quais são os
elementos imprescindíveis nesta solução?
A – Referir a
causa de Luís não poder chamar Carlos.
B – Concluir que
Luís mente.
C – Mencionar
porque é que Carlos não podia ouvir Luís a chamá-lo.
D – Concluir
sobre a cumplicidade.
1. Indica
os quatro tópicos anteriores. (10 pontos)
2. Aponta
o pormenor incriminatório, mas aplica-o a apenas a um dos empregados, sem
indicar a cumplicidade. (9 pontos)
3. Indica
os dois empregados como suspeitos do roubo, mas falha a justificação. (8
pontos)
4. Apresenta
um dos empregados como culpado, Luís ou Carlos, mas sem justificação, ou com
esta errada. (7 pontos)
5. Apresenta
outra resposta. (6 pontos)
Classificações
10 pontos
Abrótea,
Arjacasa (TPBRO), Bernie Leceiro, Bufalos Associados, Cris, Detective Jeremias,
Eduardo Oliveira, Háspide, Insp. Moscardo, Inspectora Sardinha(TPBRO), Inspetor
Boavida. Inspetora Marta, Mac Jr., Mali (TPBRO), Menino Nelito, O Gráfico
(TPBRO), Pedro Ribeiro, Tiago Reis, Xá do Reino (19 concorrentes).
9 pontos
Bertita;
Guilherme; Núbis (3 concorrente).
8 pontos
Clóvis,
Poluidora, Rosa Marques (3 concorrentes).
7 pontos
Doula (1
concorrente).
Os concorrentes
com a indicação TPBRO são membros da Tertúlia Policiária Blogue Repórter de
Ocasião.
Total de
concorrentes: 26.
Saliente-se a
dispersão de classificações, apesar da simplicidade do problema.
Vencedor (por
sorteio)
Bernie Leceiro
Caros Seguidores,
Não havendo aqui, no LOCAL DO CRIME, qualquer limitação de espaço, como acontece nas páginas do jornal AUDIÊNCIA GRANDE PORTO, publicamos na íntegra o segundo conto do Concurso “Um Caso Policial no Natal”:
“Um Caso Policial no Natal” – SEGUNDO CONTO
O FANTASMA DO HOTEL INFANTE SAGRES, de Bernie Leceiro
Começo por me apresentar, João Marcelino, filho de pai angolano e mãe
portuguesa, um mestiço nascido e criado na cidade do Porto, conhecido no mundo
do futebol amador como o Jean Pierre Papin da Corujeira. Joguei em clubes da
cidade como o São Vítor, Marechal Gomes da Costa, Ramaldense e mais
recentemente no Pasteleira. Cheguei a estar à experiência no FC Porto … como
roupeiro. Fui despedido ao fim de 3 semanas devido à minha dislexia e a ter
impresso mal o nome do meu ídolo Varela precisamente no dia de clássico com o
Benfica, uma vergonha a entrada em campo e nome Barela estampado nas costas. O
meu hobby sempre foi a literatura policial e trabalho em part-time na FNAC de
Santa Catarina. Este Natal, para ganhar algum dinheiro adicional, aproveitando
os novos movimentos contra a Homofobia, Transfobia, Bifobia e segregação
racial, socorrendo-me de uma écharpe cor-de-rosa da minha mãe e uns jeans
justos da minha meia-irmã Vanessa, concorri ao lugar de Pai Natal no mercado do
Bolhão. Nada melhor para a Associação de Comerciantes que contratar um
negro-gay. Não me posso queixar, o salário não é mau, mesmo considerando que
tenho de ouvir os maiores impropérios por parte das simpáticas peixeiras e de
quando em vez levar nos costados com um ou outro carapau. Tudo pelo espírito
natalício: “– Aí faneca, comia-te pelo rabo!”
Mas a estória que vos conto é mais interessante. Há algumas semanas,
andava enrabichado por uma artista circense Russa que atuava no Circo de Natal
do Coliseu como acrobata aérea e domadora de animais. A noite estava fria e
aguardava pacientemente no conforto do café Guarany, observando os painéis de
Graça Morais, mesmo por baixo do Hotel Aliados onde a minha princesinha estava
alojada e eu ansiava daí a algumas horas dar umas tantas cambalhotas e quiçá
ser domado por essa fantástica artista do país dos Czares. Tocou o telemóvel.
Era o Xico Bala, meu amigo de escola primária e companheiro de equipa ao longo
dos anos nesses campos pelados da cidade do Porto, atualmente trabalha como
concierge no Hotel Infante Sagres. Estava nervosíssimo, sussurrando que uma
hóspede tinha sido atacada pelo “famoso” fantasma do fundador do Hotel Infante
de Sagres que há anos habita a mansarda do edifício e se tornou uma lenda na
cidade do Porto à custa da necessidade de a cidade criar mitos e lendas que
atraiam turistas. Xico precisava urgentemente da minha ajuda para resolver o
assunto e do modo mais discreto possível.
Combinamos encontro no Maus-Hábitos, mesmo em frente ao Coliseu, para não
me afastar demasiado do meu alvo principal e não perder a oportunidade de
intercambio cultural com o meu cubinho de gelo moscovita.
– Jean Pierre, não imaginas o que me aconteceu… conheci uma hóspede lá do
hotel, uma cinquentona enxuta cheia de guito, casada com um empresário de
Valpaços. Com a desculpa das estreias da temporada de ballet no Rivoli, vem ao
Porto e aproveita para se divertir depois das peças … até já aconteceu antes.
Pois bem, desta vez veio com a filha ver a companhia de bailado da Olga Roriz,
enquanto a miúda foi para o quarto, levei-a para o sótão do hotel onde fazemos
depósito das roupas abandonadas pelos hóspedes, moveis velhos e colchões. Tudo
corria como o previsto. Estávamos no único arrumo com janela do lado da praça
Filipa de Lencastre, a que tem vista até ao cimo da rua da Picaria quando
ouvimos uma pancada seca no compartimento ao lado e passos pesados a afastarem-se
no corredor.
Continuou, num tom mais baixo com medo de que alguém o ouvisse, mesmo
abafado pelo som da música alternativa que ecoava na sala: – Assustados viemos
à porta e de imediato a gaja deu pela falta da sua carteira Tods – acho que
custa uma pipa de massa – oferta do morcão do marido, no meio da roupa que
fôramos descartando entre a porta de acesso ao sótão e os arrumos onde nos
encontrávamos.
– E o telemóvel, não ligaste para saber onde estava a mala? – perguntei.
– O telemóvel estava com ela porque a tarada gosta de se filmar enquanto
enfeita a cabeça do marido, para depois mostrar às amigas de Trás-os-Montes.
Estou assustadíssimo pois mais ninguém tinha a chave do sótão e só me vem à
lembrança a estória do fantasma do comendador. Que cagaço apanhei! Por outro
lado, ela acha que é uma tramoia minha e insiste que se a carteira não aparecer
até à hora do pequeno-almoço, vai apresentar queixa à gerência do hotel e como
é óbvio vou ser despedido pois é expressamente proibido pela administração
qualquer envolvimento entre o pessoal e os hóspedes. E logo agora nesta altura
do ano. E o que vai ser da minha relação com a minha namorada Nelinha se a
estória se souber. Nunca mais arranjo emprego em lado nenhum. Por favor, amigo
não abras essa matraca – lamentou-se Xico Bala.
Olhei para o relógio, bolas 23:50, a minha bonequinha já deve ter saído.
Liguei. No meu melhor inglês aprendido com os turistas na Ribeira a quem
pedíamos moedas para saltar da ponte D. Luís, fiquei ainda mais transtornado.
Natasha chorava copiosamente. O chimpanzé Francis que cresceu com ela nos
circos por esse mundo fora, desaparecera misteriosamente do Coliseu no final da
sua atuação ainda na 1ª parte do espetáculo. Só deram por falta dele no final e
quando estavam a proceder às arrumações e alimentação dos animais. Estava
desolada e inconsolável. Entre soluços pedia desculpa por não poder estar
comigo, mas iriam passar a noite em buscas na cidade. Francis, extremamente
afável e simpático poderia ficar agressivo fora do seu ambiente. Caramba,
primeiro o Xico, agora Natasha, que noite!
Voltei para junto de Xico Bala, mas o meu pensamento estava na mansarda
do Hotel Infante Sagres, em Francis e no conforto dos lençóis de cama do Hotel
Aliados que eu estava a perder, veio-me à lembrança o clássico de Os Crimes da
Rua Morgue de Edgar Allan Poe por muitos considerado como a primeira obra
policial de sempre e cuja leitura eu sempre recomendava na FNAC a quem se
queria iniciar na leitura deste género literário. Seria possível os dois
acontecimentos dessa noite estarem relacionados?
Liguei novamente à Natasha, uma vez mais com o meu melhor English accent:
– My love, qual é o alimento preferido de Francis?
– Paw Paw, respondeu.
– What?!?
– Asimina Triloba, é uma fruta exótica, mas normalmente só come quando
estamos em digressão no continente americano.
Desliguei, combinando encontro para mais logo na ajuda da busca por
Francis e marco o número de Nanda, uma moça roliça com banca de fruta
“estranha” no 1ºandar do Bolhão, de quem ganhei confiança e intimidade à custa
da minha fama no mercado de “abichanado”. Num final de tarde partilhamos o
exíguo espaço para troca de roupa existente no mercado, quando ela estava
atrasada para ir ao dentista e eu para a FNAC… o resto não vale a pena contar…
Nanda faltou à consulta e eu quase fui despedido por faltar mais uma vez sem
avisar.
– Olá Nanda, é Carlinhos – no mercado sou assim conhecido, uma espécie de
nome artístico para a personagem que encarno – sabes o que é a fruta Pau-Pau?
– Olá torrãozinho, em que está agora tu a pensar meu maluco?
– A minha irmã Vanessa acha que está grávida e tem esse desejo, acho que
viu a story de uma influencer no Instagram… preciso dessa fruta agora … ela
está doida … não deixa ninguém descansar – improvisei.
– Já sei o que é! acho que tenho na câmara frigorifica do mercado, é a
“banana do homem pobre” tenho uma cliente “fozeira” que é doida por isso. Diz
que lhe conserva a pele, é chanfrada, está toda encarquilhada com a cara a cair
aos bocados! Encontramo-nos no mercado daqui a meia-hora. Mas, olha lá meu
“conguito”, vai-te sair caro…
Abreviando, à hora marcada encontrei-me com a Nanda junto à porta da rua
Fernandes Tomás, na companhia do Xico a quem apresentei como o namorado da
minha irmã, não fosse ela ter ideias aquela hora da noite que me desviassem do
pretendido, peguei na fruta, despachei Nanda com um beijo bem rápido e
dirigimo-nos apressadamente para o Hotel Infante Sagres, sem antes passar no
Coliseu a apanhar a chorosa Natasha. Se tudo batesse certo, rapidamente iriamos
saciar a fome e descobrir a identidade do famoso fantasma.
Descemos as ruas Passos Manuel e Dr. Magalhães Lemos, atravessamos a
aquela hora deserta Avenida dos Aliados e percorrendo apressados a rua Elísio
de Melo chegamos ao nosso destino. Com o coração aos saltos subimos os 12
lanços da escada de serviço do hotel. Na minha retaguarda seguiam Xico e
Natasha assustadíssimos e eu sem saber muito bem o que nos aguardaria e como
reagiríamos. Aliciado pelo intenso aroma da fruta Paw Paw, que eu, entretanto
descascara e partira num tupperware que Xico fora apanhar na cozinha, do fundo
do escuro corredor surge o fantasma, nada mais nada menos que Francis. Com um
velho abajur a enfeitar a cabeça, a mala da dama debaixo do braço e a beiça
pintada de um vermelho Chanel, oriundo de algum batom abandonado no interior da
mala, que enfeitava um imenso sorriso como a dar-nos as boas-vindas.
O malandro tinha entrado no pátio interior pelo acesso de serviço do lado
da rua do Almada, subiu por um tubo de queda do alçado tardoz do hotel e entrou
por uma estreita janela sempre aberta de uma velha casa de banho fora de
serviço ao fundo do corredor e onde se tinha refugiado.
Natasha estava radiante, Francis
deliciado com a sua fruta favorita e Xico Bala eternamente agradecido, salvara
o emprego e poderia manter os seus esquemas amorosos.
04:40, a noite estava salva e o Natal de 2014 também. Este que foi o último ano em que o famoso circo de Natal do Coliseu teve a atuação de animais em pista. A tradição mantém-se desde 1941, ano da inauguração do Coliseu, o Circo que é uma das principais e mais concorridas atrações de Natal da cidade do Porto.
SEGUNDO CONTO DO CONCURSO “UM CASO POLICIAL
NO NATAL”
O segundo original do nosso concurso de contos “Um Caso Policial no Natal”, de que se publica hoje a sua primeira parte, tem por protagonista João Marcelino, rei do futebol amador portuense, conhecido como Jean Pierre Papin da Corujeira, que nos leva até ao coração da baixa da cidade Invicta, ao mítico Coliseu do Porto e ao emblemático Hotel Infante de Sagres, onde trabalha o seu amigo Xico Bala e “habita” um estranho fantasma. E, como estamos na época natalícia, vamos encontrá-lo no Mercado do Bolhão, vestido de Pai Natal, para ganhar uns trocos…
“Um Caso Policial no Natal” – SEGUNDO CONTO
O FANTASMA DO HOTEL INFANTE SAGRES, de Bernie Leceiro
I – PARTE
Começo por me apresentar, João Marcelino, filho de pai angolano e mãe
portuguesa, um mestiço nascido e criado na cidade do Porto, conhecido no mundo
do futebol amador como o Jean Pierre Papin da Corujeira. Joguei em clubes da
cidade como o São Vítor, Marechal Gomes da Costa, Ramaldense e mais
recentemente no Pasteleira. Cheguei a estar à experiência no FC Porto … como
roupeiro. Fui despedido ao fim de 3 semanas devido à minha dislexia e a ter
impresso mal o nome do meu ídolo Varela precisamente no dia de clássico com o
Benfica, uma vergonha a entrada em campo e nome Barela estampado nas costas. O
meu hobby sempre foi a literatura policial e trabalho em part-time na FNAC de
Santa Catarina. Este Natal, para ganhar algum dinheiro adicional, aproveitando
os novos movimentos contra a Homofobia, Transfobia, Bifobia e segregação
racial, socorrendo-me de uma écharpe cor-de-rosa da minha mãe e uns jeans
justos da minha meia-irmã Vanessa, concorri ao lugar de Pai Natal no mercado do
Bolhão. Nada melhor para a Associação de Comerciantes que contratar um
negro-gay. Não me posso queixar, o salário não é mau, mesmo considerando que
tenho de ouvir os maiores impropérios por parte das simpáticas peixeiras e de
quando em vez levar nos costados com um ou outro carapau. Tudo pelo espírito
natalício: “– Aí faneca, comia-te pelo rabo!”
Mas a estória que vos conto é mais interessante. Há algumas semanas,
andava enrabichado por uma artista circense Russa que atuava no Circo de Natal
do Coliseu como acrobata aérea e domadora de animais. A noite estava fria e
aguardava pacientemente no conforto do café Guarany, observando os painéis de
Graça Morais, mesmo por baixo do Hotel Aliados onde a minha princesinha estava
alojada e eu ansiava daí a algumas horas dar umas tantas cambalhotas e quiçá
ser domado por essa fantástica artista do país dos Czares. Tocou o telemóvel.
Era o Xico Bala, meu amigo de escola primária e companheiro de equipa ao longo
dos anos nesses campos pelados da cidade do Porto, atualmente trabalha como
concierge no Hotel Infante Sagres. Estava nervosíssimo, sussurrando que uma
hóspede tinha sido atacada pelo “famoso” fantasma do fundador do Hotel Infante
de Sagres que há anos habita a mansarda do edifício e se tornou uma lenda na
cidade do Porto à custa da necessidade de a cidade criar mitos e lendas que
atraiam turistas. Xico precisava urgentemente da minha ajuda para resolver o
assunto e do modo mais discreto possível.
Combinamos encontro no Maus-Hábitos, mesmo em frente ao Coliseu, para não
me afastar demasiado do meu alvo principal e não perder a oportunidade de
intercambio cultural com o meu cubinho de gelo moscovita.
– Jean Pierre, não imaginas o que me aconteceu… conheci uma hóspede lá do
hotel, uma cinquentona enxuta cheia de guito, casada com um empresário de
Valpaços. Com a desculpa das estreias da temporada de ballet no Rivoli, vem ao
Porto e aproveita para se divertir depois das peças … até já aconteceu antes.
Pois bem, desta vez veio com a filha ver a companhia de bailado da Olga Roriz,
enquanto a miúda foi para o quarto, levei-a para o sótão do hotel onde fazemos
depósito das roupas abandonadas pelos hóspedes, moveis velhos e colchões. Tudo
corria como o previsto. Estávamos no único arrumo com janela do lado da praça
Filipa de Lencastre, a que tem vista até ao cimo da rua da Picaria quando
ouvimos uma pancada seca no compartimento ao lado e passos pesados a afastarem-se
no corredor.
Continuou, num tom mais baixo com medo de que alguém o ouvisse, mesmo
abafado pelo som da música alternativa que ecoava na sala: – Assustados viemos
à porta e de imediato a gaja deu pela falta da sua carteira Tods – acho que
custa uma pipa de massa – oferta do morcão do marido, no meio da roupa que
fôramos descartando entre a porta de acesso ao sótão e os arrumos onde nos
encontrávamos.
– E o telemóvel, não ligaste para saber onde estava a mala? – perguntei.
– O telemóvel estava com ela porque a tarada gosta de se filmar enquanto
enfeita a cabeça do marido, para depois mostrar às amigas de Trás-os-Montes.
Estou assustadíssimo pois mais ninguém tinha a chave do sótão e só me vem à
lembrança a estória do fantasma do comendador. Que cagaço apanhei! Por outro
lado, ela acha que é uma tramoia minha e insiste que se a carteira não aparecer
até à hora do pequeno-almoço, vai apresentar queixa à gerência do hotel e como
é óbvio vou ser despedido pois é expressamente proibido pela administração
qualquer envolvimento entre o pessoal e os hóspedes. E logo agora nesta altura
do ano. E o que vai ser da minha relação com a minha namorada Nelinha se a
estória se souber. Nunca mais arranjo emprego em lado nenhum. Por favor, amigo
não abras essa matraca – lamentou-se Xico Bala.
Olhei para o relógio, bolas 23:50, a minha bonequinha já deve ter saído.
Liguei. No meu melhor inglês aprendido com os turistas na Ribeira a quem
pedíamos moedas para saltar da ponte D. Luís, fiquei ainda mais transtornado.
Natasha chorava copiosamente. O chimpanzé Francis que cresceu com ela nos
circos por esse mundo fora, desaparecera misteriosamente do Coliseu no final da
sua atuação ainda na 1ª parte do espetáculo. Só deram por falta dele no final e
quando estavam a proceder às arrumações e alimentação dos animais. Estava
desolada e inconsolável. Entre soluços pedia desculpa por não poder estar
comigo, mas iriam passar a noite em buscas na cidade. Francis, extremamente
afável e simpático poderia ficar agressivo fora do seu ambiente. Caramba,
primeiro o Xico, agora Natasha, que noite!
(continua na próxima edição)
TORNEIO CULTORES DO POLICIÁRIO
Torneio Cultores do Policiário
1º Problema
“O Misterioso Desaparecimento de uma
Aliança Velha”, de O Gráfico
I - PARTE
Quando me
reformei, no ano de 2018, estava longe de pensar que iria encontrar na
Pastelaria Kimi que comecei a frequentar assiduamente, um ror de gente, de
elevado espírito comunicativo, abertura fraterna de receber novos rostos e um
atendimento público (mais tarde denominado como “CAC” – “com amor e
carinho”!) de categorizada e inigualável distinção, todas estas coisas
boas, de enaltecer, entre habituais clientes, pessoal ali empregado e
respectivos gerentes.
O quotidiano é
acolhedor e quando se chega à Quadra Natalícia, os sorrisos, os beijos, os
abraços, o partilhar de mesa, os apertos de mãos, os votos de felicidade e
desejos de um Bom Natal e um Novo Ano Feliz... transcendem-se! Entretanto
passámos por uma Pandemia, a tal de “Covid-19”, e as faculdades intelectuais e
a energia dos habituais clientes entrelaçada com os trabalhadores da Kimi
mantiveram-se inalteráveis se bem que ainda me recordo de tomar o meu
pequeno-almoço, cá fora, no parapeito das janelas do estabelecimento e do uso
obrigatório da máscara que só era retirada para o consumo dos alimentos.
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Nos primeiros
meses de 2018 comecei a ouvir falar, entre colegas e outras pessoas com a minha
mesma idade, 60 anos, de que os trabalhadores, em Portugal, com 46 anos de
“descontos” para a Segurança Social, já se poderiam reformar... por “inteiro”,
ou seja, reforma antecipada usufruindo do valor mensal igual ao actual
vencimento! Haveria no país poucos milhares de pessoas com esta particularidade
e o Governo do Primeiro-Ministro António Costa lançou esta iniciativa! Ora,
pelas minhas “contas” eu já descontava para a antiga Caixa Nacional de Pensões
desde 1970 o que daria, se tudo estivesse documentado e registado, muito
próximo de 48 anos de “descontos”... entre 1970 e 2018. Não hesitei um
segundo... telefonei para Entre Campos, Lisboa, Atendimento
por marcação no Centro Nacional de Pensões e marquei uma consulta.
Creio que foi em Junho de 2018, já com 60 anos feitos ou muito próximo disso...
que fui, então, a Entre Campos. Lá chegado, ao ser atendido, somente me pediram
o Cartão de Cidadão e passados alguns segundos responderam-me “que já
me podia reformar”, dentro dos requisitos enumerados pelo Governo,
pois, desfrutava, tal e qual como tinha pensado, de 48 anos de “descontos” para
a Segurança Social. Não esperei pela demora... preenchi, no imediato, os
documentos necessários, comuniquei a minha decisão à Entidade Patronal vigente
e... no mês de Agosto, seguinte, já estava reformado, contente da vida! Pensado
e executado. Valeu a pena, pelo menos neste capítulo, ter começado a trabalhar
com tenra idade, apesar dos 48 anos árduos de labuta.
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A Pastelaria
Kimi, situada no Laranjeiro, Feijó, Conselho de Almada, apresenta-se
estruturalmente numa forma muito original que tem como base um triângulo,
imaginando-se a olharmos para um desenho de uma Árvore de Natal, com três
entradas e saídas para clientes. Olhando de frente, o leitor, depara-se com a
entrada principal, a porta maior, que está instalada na base do mencionado triângulo,
dando lugar a uma esplanada que preenche uma parte da praceta onde se encontra.
No lado direito, sensivelmente a meio do triângulo, existe a segunda porta,
digamos assim e no vértice uma outra porta, mais pequena, que aparentemente
está vedada à entrada de clientes semi-obstruída por duas cadeiras. Esta
entrada serve especialmente para entrada e saída de fornecedores, mais usada
pelos Padeiros que durante todo o dia vão entrando por ali com caixas repletas
de pão, nomeadamente carcaças, os chamados papos-secos e saindo com as mesmas
vazias evitando o passar pela maioria das pessoas que se aglomeram na sala
entre a primeira e um pouco mais além da segunda entrada. Eles chegam, num
ápice, após pedido, com os recipientes do pão, passam pelo lavatório que
antecede as chamadas “casas de banho” (estas encontram-se por trás do
lavatório, mas estão, sempre, fechadas à chave pelo que homens e senhoras terão
de solicitar as respectivas, ao balcão, para efectuar as suas necessidades de
obrigação imprescindível) descem dois degraus entram pela segunda abertura do
balcão, percorrem todo o seu curto comprimento, cerca de 10 metros, despejam o
conteúdo nos receptáculos adequados para o efeito, entre “bons-dias” e sorrisos
e fazem o trajecto de regresso.
O primeiro
ingresso do citado balcão encontra-se logo à esquerda da entrada principal que
se apresenta direccionada para a esplanada e está quase tapado pela
refrigeradora das bebidas, do lado de fora e da máquina dos sumos de laranja,
na parte de dentro. Logo a seguir, mas inserta na parede da frente, ainda por
detrás do balcão, em cima de uma pedra de mármore está a caixa registadora,
depois estantes envidraçadas com pão que fica por cima dos recipientes dos
papos-secos, elevador de comunicação e transporte de géneros alimentícios entre
rés-do-chão e cave, grande máquina dos cafés e estantes de vidro que terminam
na entrada da segunda abertura onde estão, em cima, o tabaco e bugigangas e por
baixo, à altura da cintura de um ser humano, adulto, as várias bebidas
alcoólicas, tais como Brandys, Whiskys, Vinho do Porto, Aguardentes e outros de
muitas marcas. Por baixo, do lado de cá e do lado de lá, do balcão, existem armários
de armazenamento. Para os clientes que consomem ao balcão e eu sou um deles,
estão as vitrinas com as especialidades de arregalar a vista! No lado direito,
da abertura do balcão, mais próxima das casas-de-banho, que não têm qualquer
abertura para o exterior, foi arquitectado também uma pequena espécie de
arrecadação, num aproveitamento de espaço, que fica por baixo das escadas que
levam ao equivalente a um 1.º andar onde igualmente se fornecem refeições. Nas
vésperas de Natal uma corrente impede o acesso aquele local porque não se
servem almoços. Estas escadas encontram-se entre o lavatório e ao lado dos
degraus que dão entrada para o balcão, por aquele lado. Neste reduzido cubículo
os empregados que se vão revezando por períodos horários guardam os seus
pertences, casacos, malas, sacos com compras, etc.
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No dia-a-dia a
azáfama é intensa e muitos vendedores ambulantes e de rua que ali vão tomar o
seu pequeno-almoço levam consigo grandes sacos com muita e diversificada
indumentária, além de lençóis, material de pano para cozinhas, etc, na
tentativa de seduzir alguns compradores. Uma vez comprei um par de lençóis....
por uma pechincha.
O Miguelito, um
jovem de 16 anos é uma das atracções principais que aprecio e aplaudo, das
minhas manhãs, na Pastelaria Kimi. Por volta das 11 horas, todos os dias, sem
falhar nenhum, sábados e domingos, entra de rompante, pela entrada principal,
vindo da praceta e com a sua pequena máquina fotográfica “dispara” em
todos os sentidos e direcções repetindo incessantemente “-Olha a
foto!”... “-Olha a foto!”... e lá vai ele obtendo fotografias dos três
empregados e gerente que habitualmente estão atrás do balcão, de clientes que
estão no compartimento de entrada, uns sentados ou em pé ingerindo os alimentos
ao balcão. O jovem Miguelito que diz um dia querer ser Jornalista Fotográfico
delicia-se com as fotografias e toda-a-gente faz poses originais e colabora, com
os largos sorrisos da praxe! É um momento de enorme animação.
Chegamos à época
Natalícia e é tudo igual, vivência, camaradagem e procedimentos à excepção que
a porta do meio é encerrada a entradas e saídas porque no lado direito da
entrada pela praceta até sensivelmente a meio do espaço é montada uma mesa em
“L” para venda de produtos apropriados e lá se encontram de fazer crescer água
na boca... BOLO
REI, BOLO RAINHA, TRONCOS DE NATAL, LAMPREIA, TORTAS VARIADAS, FILHOZES,
COSCORÕES, SONHOS DE ABÓBORA E VARIADOS, AZEVIAS DE GILA, GRÃO E BATATA-DOCE,
FATIAS PARIDAS, ENTREMEIOS DIVERSOS, SORTIDOS E OUTRAS VARIEDADES. Uf! Que pena
não se conseguir ingerir de tudo... um pouco!
Uma vez
considerei que o pão com manteiga tinha pouco fiambre e a partir daí começaram
a pôr 3 fatias do mesmo produto e quando lá aparecia... logo gritavam para o
micro do elevador que fazia ligação com a cozinha: “-Atenção, essa
carcaça que vai para baixo... é para colocar três fatias de
fiambre! Três fatias de fiambre!” E noutras vezes acrescentavam: “-É
para o senhor Rodrigues!”. Ultimamente achei um exagero e
mandei reduzir somente, a sandes, para duas fatias!
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Hoje, pela
manhã, precisamente, neste dia em que escrevo estas linhas, Domingo, 24 de
Dezembro de 2023, o insólito aconteceu na Pastelaria Kimi. Como sou bem tratado
e muito bem recebido naquele estabelecimento resolvi oferecer uma Garrafa de
Aguardente Aliança Velha ao gerente, meu amigo, Rui Marino. Dizem que este
produto é o mais vendido no mercado e fiz questão de mostrar os meus
agradecimentos com esta simbólica oferta de Natal! Cheguei à Kimi por volta das
10h e 45m e quando entreguei a prenda foi uma alegria, para todos! O Rui Marino
agradeceu-me olhou para a garrafa com os olhos a brilhar e colocou-a, bem
vistosa, à minha frente, numa das estantes de vidro, junto com as outras
bebidas do género e... disse bem alto, para o “seu” pessoal: “-Atenção,
nesta... ninguém mexe, ok!?”. E voltou às lides.
A Pastelaria
Kimi, naquela hora, estava a transbordar pelo que durante uma quinzena de
minutos ninguém entrava nem saía, a não ser clientes para as guloseimas de
Natal. Entravam, compravam o necessário e saíam pela mesma porta. Vendedores de
rua tentavam convencer alguns clientes a adquirir as suas “coisas boas”!
Alguns, homens e mulheres, necessitando de ir às casas-de-banho solicitavam as
chaves que estavam penduradas no cimo do cubículo dos empregados. A próxima
mudança de turno seria somente ao meio-dia. Eu tomava o meu pequeno-almoço
descansado e a observar como os Troncos de Natal, os Sonhos de Abóbora e os
Coscorões “voavam” dali para fora... do Bolo-Rei, então, nem
os conseguia contar... até que um enorme alvoroço sucedeu em simultâneo... com
mais pão a chegar e o Miguelito a entrar pelo meio das pessoas de máquina no ar
e a gritar “-Olha a foto!”... “-Olha a foto!”... Uma alegria e
diversão imensas! Até que o insólito aconteceu... no meio de tanto entusiasmo,
passados uns breves momentos..., o Rui Marino gritou alto e em bom som com
enorme aflição: “-Onde está a garrafa!?” Ui...
virei-me para a estante das Aguardentes e o Rui estava branco como a cal da
parede! A agradável Aguardente Aliança Velha que eu lhe tinha oferecido...
tinha desaparecido misteriosamente! “-Ninguém sai daqui!” Gritou
ele. Toda a gente obedeceu fecharam-se as portas e mais nenhuma pessoa entrou
ou saiu do Estabelecimento e no imediato todos foram revistados e... nada de se
descobrir onde estava a Aliança Velha! O cubículo dos empregados foi
analisado... sem sucesso! O andar de cima, também. A cozinha, lá em baixo,
outrossim e a garrafa sem aparecer! Todos os sacos, enormes, dos vendedores de
rua foram despejados e nada de garrafa! Nos cestos do lixo... também não se
encontrava a Aliança Velha! Casas-de-banho vistas de alto a baixo e buscas
infrutíferas! Na refrigeradora... nada! Em lugar nenhum foi encontrada a
Aliança Velha! Resignado o Rui Marino ordenou que tudo regressasse à
normalidade!
Que coisa!? Quem
teria feito desaparecer misteriosamente a garrafa de Aliança Velha!?
Pensativo...
despedi-me e regressei a casa.
Absorto e
arrebatado nos meus pensamentos, sobre o sucedido, foi quando me sentei ao
computador para mais umas publicações no Blogue do “Repórter de Ocasião” e
pensando que este seria mais um interessante caso para o “Inspector
Rodriguinho” e o seu famoso “Ajudante Lumafero”... que me veio uma “proposta
de solução” deste misterioso caso... à ideia! “-Pois... é!”
“-Só pode!...” Deduzi.
Regressei, ainda
esta tarde, à Pastelaria Kimi... conversei com o Rui... ele boquiaberto
concordou comigo e... posteriormente o caso foi deslindado!
PERGUNTA-SE AO LEITOR:
- Como teria desaparecido misteriosamente a Garrafa da Aguardente
Aliança Velha?
Escreva a II PARTE da história relatando como tudo teria
sucedido, narrando a sua opinião sobre o caso, elaborando a sua “proposta
de solução”! [a enviar até ao dia 31 de janeiro, utilizando para o efeito
os emails reporter.de.ocasiao@gmail.com e lumaferoma1958@sapo.pt ou o endereço postal Luís Manuel Felizardo Rodrigues /
Praceta Bartolomeu Constantino, 14, 2º Esq. / Feijó 2810-032 Almada].